Uma técnica para diagnosticar câncer de pele pelo olfato abre caminho para a criação do nariz eletrônico ou utilização de cachorros para diagnósticos.
A associação entre determinadas doenças e o odor que elas provocam no hálito, no suor ou na urina é antiga como a prática da medicina. Na Grécia antiga, Hipócrates já cheirava a boca dos pacientes para identificar desequilíbrios no organismo, costume que se disseminou na Idade Média. Embora tenha se tornado arcaico no século XX, esse procedimento nunca foi totalmente abandonado pelos médicos e, agora, ressurge amparado nos avanços da tecnologia. No mês passado, o Monell Chemical Senses Center, um instituto americano de pesquisas na área de olfato e paladar, anunciou uma técnica capaz de diagnosticar pelo cheiro o carcinoma basocelular, o tipo mais comum de câncer de pele. A técnica consiste em separar as moléculas dos compostos voláteis emanados pela pele através de um processo chamado cromatografia. A seguir, esses componentes são analisados e classificados pela espectrometria. Os pesquisadores do Monell Center colheram amostras do ar localizado imediatamente acima dos tumores de um grupo de pacientes e as compararam com as do ar colhido na mesma região do corpo em indivíduos sadios. O resultado foi que, embora as amostras de ar colhidas nos dois grupos tivessem a mesma composição, havia diferenças consideráveis na quantidade das substâncias químicas que as constituíam.
O objetivo de pesquisas como a do Monell Center é, no futuro próximo, desenvolver máquinas que funcionem como narizes eletrônicos no diagnóstico de doenças. Em muitos casos, esses equipamentos poderiam substituir procedimentos invasivos, como as biópsias. Os cientistas vêm perseguindo a idéia de um nariz eletrônico desde os anos 70, quase sempre usando a cromatografia e a espectrometria. Nesse período, já foram identificados mais de 3 000 compostos voláteis que emanam do corpo humano. O desafio agora é compreender a que tipo de doença as mudanças nesses compostos estão relacionadas. É preciso, também, encontrar uma maneira de acelerar a análise dos compostos, que hoje pode levar dois dias.
Outros experimentos na área do diagnóstico por olfato são feitos com o uso de cães. Em todo o mundo, pesquisas indicam que cachorros treinados conseguem identificar cânceres como os de bexiga, mama, pulmão e pele apenas farejando a respiração ou o corpo do paciente. "Um schnauzer detectou uma metástase com vinte células, tão pequena que foi preciso verificá-la no microscópio", disse a VEJA o médico György Horvath, da Universidade Sahlgrenska, da Suécia. Horvath chefiou uma das mais recentes pesquisas desse tipo e concluiu que o olfato canino pode identificar tumores no ovário com 97,5% de precisão. O uso de cães nos diagnósticos por olfato funciona, mas para treinar os animais são necessários muito tempo e dedicação. Além do mais, embora identifiquem a doença, os cães não são capazes de detalhar os compostos voláteis que cheiram e, dessa forma, obter informações mais precisas sobre eles. Para que o olfato se torne parte da rotina do check-up, ainda falta desenvolver o nariz eletrônico. Observa o médico e escritor gaúcho Moacyr Scliar: "Seu advento vai unir a medicina de observação dos tempos de Hipócrates com a tecnologia do século XXI".
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