quinta-feira, 20 de maio de 2010

Cientistas elogiam "bactéria sintética", mas evitam falar em revolução na genética

Barack Obama pediu recomendações para identificar limites éticos e diminuir riscos


DivulgaçãoFoto por DivulgaçãoPesquisadores criaram célula viva de
bactéria produzida a partir de genoma artificial

Para cientistas de todo o mundo, o anúncio da criação pela equipe de John Craig Venter da primeira célula parcialmente sintética, que foi saudado como o primeiro passo em direção à criação artificial da vida, não foi tão revolucionário assim. Os pesquisadores conseguiram criar uma célula viva de bactéria produzida a partir de genoma (conjunto de genes de uma determinada espécie) sintético. A expectativa é que a descoberta possa permitir, por exemplo, a fabricação de bactérias em laboratório.

Eles dizem que apenas o genoma era sintético. Já a célula que recebeu o código genético foi equipada pela natureza, por bilhões de anos, para fazer com que os genes fizessem sentido. Mesmo assim, os colegas elogiaram Venter e sua equipe por mostrar que um transplante genômico é possível.

Depois do anúncio, o presidente americano Barack Obama pediu à Comissão Presidencial para o Estudo de Assuntos Bioéticos que elaborasse um estudo sobre o impacto da experiência no mundo dos negócios, revelou a agência de notícias France Presse.

Em carta à chefe da comissão, Amy Gutman, Obama pediu que ela “considerasse os benefícios potenciais à medicina, ao ambiente e à saúde desse tipo de pesquisa, assim como os riscos potenciais à saúde, à segurança”.

Obama também pediu à comissão recomendações sobre as ações que o governo deverá tomar “para garantir que os Estados Unidos colham os benefícios desse área científica enquanto identificam os limites éticos e diminuem os riscos”.

Embora ainda estejamos longe da criação de vida artificial, o feito foi descrito pela revista científica Science como um marco no controle de organismos vivos pela manipulação de seus genes.

Segundo o professor Gonçalo Guimarães Pereira, chefe do departamento de genética da Unicamp (Universidade de Campinas), a técnica de pegar um pedaço de um organismo e colocar em outro já vem sendo usada há mais de duas décadas. Para Pereira, o feito não é novo, apenas foi feito em uma escala maior.

- O que eles mostraram foi que, se já sabíamos construir uma ponte de 50 ou 100 metros, agora somos capazes de montar uma de 500 quilômetros.

Para Lygia Pereira, professora associada do departamento de genética e biologia evolutiva da USP (Universidade de São Paulo), “o avanço é sensacional”, porque abre perspectivas enormes para a criação de organismos vivos com funções que tragam benefícios ao ser humano e à natureza.

- Mas, como toda novidade científica, temos que avançar com cautela para evitarmos efeitos colaterais inesperados.

De acordo com a pesquisa, publicada pela revista científica Science, a equipe de Venter trabalhou com uma versão sintética do DNA de uma pequena bactéria chamada Mycoplasma mycoides, que foi transplantada em um outro germe, o Mycoplasma capricolum, que teve praticamente todo o seu interior "limpo". Depois de um tempo, a nova bactéria começou a se multiplicar em laboratório.

Para o professor da Unicamp, o feito científico divulgado nesta terça-feira (20) foi uma “demonstração de força” da biologia sintética, de que é capaz de criar produtos eficientes. Ele explica que, atualmente, esse campo de estudos vem sendo usado para substituir produtos feitos a partir do petróleo. A próxima etapa será fazer isso a partir do gás carbônico, justamente um dos vilões do aquecimento global.

- O futuro de nossa sociedade depende de nossa capacidade de criar organismos que convertam o gás carbônico (CO2), por exemplo, em produtos plásticos para que possamos evitar o colapso do meio ambiente.

A técnica também poderia ser usada para fins nada nobres, como a criação de organismos patogênicos (causadores de doenças), como o antraz, para o uso em guerras biológicas. Mas cientistas do grupo do Conselho Nacional de Biossegurança, nos Estados Unidos, disseram que a técnica não representa uma ameaça.

Em entrevista ao jornal Washington Post, o biólogo molecular Paul Keim, chefe do conselho que orienta o governo sobre os usos das tecnologias, disse que a técnica não oferece perigo algum porque a equipe de Venter produziu um genoma cuja estrutura e função já eram conhecidos. Keim acrescentou que “eles não criaram nenhuma forma nova de vida”.




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